Desmatamento e mudanças climáticas: quem paga essa conta?
- Solano Ferreira
- 31 de out.
- 2 min de leitura

A Floresta Amazônica, reconhecida como um dos maiores reguladores climáticos do planeta, está sendo empurrada perigosamente em direção ao seu ponto de ruptura. O desmatamento, as queimadas e as chamadas “falsas soluções” para o aquecimento global — como a financeirização da natureza e o greenwashing — colocam em risco não apenas a biodiversidade, mas também o equilíbrio climático mundial.
De janeiro a setembro de 2024, 51% dos focos de incêndio registrados no Brasil ocorreram na Amazônia, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Nesse período, uma área equivalente a todo o estado de Roraima foi queimada. O impacto é devastador: o bioma, que atua como sumidouro de carbono e regulador de chuvas, passa a emitir mais gases de efeito estufa do que absorver — um sinal de que a floresta pode estar se tornando parte do problema que sempre ajudou a conter.
Além do fogo, a seca recorde de 2024 atingiu 69% dos municípios da Amazônia Legal, afetando cerca de 770 mil pessoas e gerando prejuízos superiores a R$ 620 milhões. O fenômeno, ligado ao El Niño e ao aquecimento do Atlântico Norte, escancarou a vulnerabilidade das populações locais — especialmente ribeirinhos, agricultores familiares e povos indígenas.
Mas, enquanto os impactos se intensificam, os recursos destinados ao enfrentamento da crise climática nem sempre chegam a quem mais precisa. Um estudo da Rainforest Foundation da Noruega revelou que, entre 2011 e 2020, povos indígenas receberam apenas 0,13% dos recursos globais voltados à mitigação das mudanças climáticas. No Brasil, que captou em média R$ 25 bilhões por ano entre 2015 e 2020 para ações climáticas, a concentração do financiamento é notável: 95% dos recursos vieram de fontes domésticas, sendo que dois terços (R$ 15,9 bilhões) ficaram concentrados em programas públicos e corporativos.
Na prática, o discurso da “economia verde” tem beneficiado mais empresas e intermediários financeiros do que comunidades que preservam o bioma há séculos. Enquanto isso, apenas 12% dos mais de 3,6 milhões de estabelecimentos da agricultura familiar conseguiram acessar crédito de custeio em 2020 — um retrato do abismo entre quem produz e quem recebe o financiamento.
Os especialistas alertam que, até 2050, entre 10% e 47% da Floresta Amazônica poderá estar exposta a perturbações severas — como incêndios recorrentes, secas extremas e degradação irreversível — capazes de alterar o regime de chuvas em todo o continente. O “ponto de não retorno” do bioma, em que a floresta deixa de se regenerar e se transforma em savana, está mais próximo do que nunca.
Evitar essa catástrofe exige transparência na gestão dos fundos climáticos, participação direta das comunidades tradicionais e uma reorientação urgente das políticas públicas. A conta da destruição ambiental não é apenas financeira — é climática, social e moral. Se nada mudar, será paga por todos nós.










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