top of page
Foto do escritorSolano Ferreira

Imaflora apresenta na China protocolo de monitoramento da pecuária

Imaflora apresenta proposta de protocolo de monitoramento ao mercado chinês para promover o reconhecimento da carne livre de desmatamento ilegal.

Foto: Freepik

pecuária
Boas práticas na pecuária são assunto no Brasil e na China















A transição ecológica e a negociação de protocolos para a exportação de produtos agrícolas brasileiros já foram anunciadas pelo Itamaraty como dois pilares das negociações que devem acontecer entre Brasil e China na quarta-feira (20/11), quando os presidentes Xi Jinping e Luís Inácio Lula da Silva estarão reunidos para desenvolvimento de uma agenda bilateral de cooperação e relacionamento comercial em diferentes áreas. O encontro é o ponto alto de um ano marcado pelo cinquentenário da relação comercial entre os dois países e acompanhado com grande interesse pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), recém-chegado de uma missão na China com duas apresentações para governo e empresários chineses sobre o Boi na Linha, o protocolo utilizado pelo Ministério Público Federal para monitoramento e verificação da conformidade socioambiental de empresas da cadeia da carne na Amazônia. “Fomos muito bem recebidos e há interesse dos empresários chineses em entender os princípios do Boi na Linha e sua aplicação nos negócios. O próximo passo será testar o uso do protocolo, já em 2025, para compreensão da base de fornecedores brasileiros com que operam”, conta Marina Guyot, gerente de Políticas Públicas do Imaflora.

 

As apresentações aconteceram nos dias 7 e 8 de novembro, em Xangai, e coroaram um ano de trabalho junto a autoridades e stakeholders ligados ao comércio, processamento e distribuição de carne para o mercado chinês. A primeira aconteceu a convite da Câmara de Comércio da China para Importação e Exportação de Alimentos, Produtos Nativos e Subprodutos Animais (CFNA) durante a 15ª Conferência Internacional da China sobre Carne, dentro da CIIE (Chinese International Import Expo) e foi sucedida por um workshop com empresas e representantes do governo no dia seguinte. Ambas destacaram a importância do protocolo para a regulação social e ambiental da pecuária, os resultados obtidos ao longo de sua implementação, um panorama da pecuária brasileira e uma análise de como o reconhecimento do protocolo por autoridades e compradores chineses pode alavancar a aplicação do Boi na Linha para toda a pecuária nacional.

 

“Do lado brasileiro, tivemos interação com Apex e representantes da indústria da carne, os quais convidamos a construir em conjunto um caminho para obter reconhecimento e valorização pelo mercado chinês dos procedimentos e das boas práticas já adotadas em relação à conformidade socioambiental do produto brasileiro, de modo a favorecer tanto o que já está sendo feito, sem reinventar a roda, quanto a incluir  os frigoríficos que ainda não utilizam o protocolo, mas ambicionam entrar no mercado chinês. A Abiec tem sido parceira na apresentação do protocolo já adotado por grande parte dos seus associados”, diz Guyot. 

 

O procurador da República Rafael Rocha, do Ministério Público Federal, também participou da apresentação do protocolo e concorda que o mercado se beneficiaria de sua extensão: “É importante que todos possam aderir aos esforços para a regularização da cadeia produtiva da pecuária. O monitoramento socioambiental da carne nada mais é do que o cumprimento da legislação brasileira. Disseminar essas informações é uma estratégia para ajudar as empresas a melhorarem sua performance em termos de sustentabilidade”, afirma ele.

 

Interesses alinhados


O reconhecimento de um processo de avaliação, como o Boi na Linha, pode valorizar a carne nacional e alinha interesses de ambos os países, que já se movimentam no sentido de implementar políticas de rastreabilidade individual do rebanho e de avaliação de conformidade.  Favorece também outro ponto de interesse do governo chinês: o desmatamento ilegal zero, objeto de uma declaração conjunta de Lula e Xi Jinping. “Essa confluência de interesses e critérios viabiliza o avanço do diálogo em torno do Boi na Linha tanto no âmbito das relações comerciais, quanto intergovernamentais”, afirma Guyot.

 

O eventual reconhecimento formal do Boi na Linha promete vantagens para todos.

Autoridades sanitárias e importadores chineses passariam a contar com um instrumento reconhecido por autoridades brasileiras (no caso, o Ministério Público Federal) para garantir a conformidade socioambiental do produto. O Brasil, por sua vez, preservaria sua soberania no estabelecimento das regras de conformidade e os frigoríficos brasileiros seguiriam aplicando um protocolo já conhecido e atendido por órgãos representativos do setor, como a Associação Brasileira da Indústria Frigorífica (Abiec).

 

“A China é o maior importador da carne brasileira e tem grande poder de influência sobre as práticas da pecuária nacional. O desenvolvimento de uma pecuária responsável e de baixas emissões seria muito favorecido se o Boi na Linha, devidamente adaptado, fosse adotado pela China como reconhecimento de uma carne isenta de desmatamento ilegal e de trabalho análogo à escravidão, dentre outros ilícitos”, explica Guyot. “Queremos ouvir e incorporar as contribuições desses importantes parceiros e também da indústria brasileira, abrindo uma via de diálogo para o aprimoramento do protocolo e da atividade pecuária”.

 

A carne na balança


Para dimensionar a influência da China sobre a atividade, basta lembrar que ela consumiu 54,4% das exportações de carne brasileira em 2023, gerando divisas da ordem de R$ 61,4 bilhões – 33,5% da balança brasileira de produtos agropecuários no ano. Também pelo lado chinês, a parceria é estratégica. Embora o país seja o terceiro maior produtor de carne bovina do mundo, a produção interna não basta para atender a população e tem custo superior ao do produto importado. Como consequência, no mesmo ano de 2023, a China importou 281 bilhões de toneladas de carne, tendo no Brasil seu principal fornecedor – 44% do total importado. Cortes menos nobres e carnes congeladas e picadas têm sido os principais itens dessa balança, de acordo com informações da Bella Terra Consulting, empresa dedicada a unir a China e o mundo por meio de soluções sustentáveis e que vem subsidiando a atuação do Imaflora junto ao mercado chinês.

 

Outro fator a ser considerado é que a China implementa uma transição em seu modelo de desenvolvimento, migrando para o que chama de Civilização Ecológica. O acelerado desenvolvimento industrial retirou 850 milhões de chineses da pobreza, mas deixou um legado de problemas ambientais e a necessidade de garantir segurança alimentar para uma população de 1,4 bilhão de pessoas. A resposta a esse cenário – trazida pelo 14ª Plano Quinquenal, que estabeleceu metas econômicas e sociais para a China no período de 2021 a 2025 – é a evolução para uma civilização ecológica e um estilo de vida de baixo carbono. Como resultado, a China anunciou em 2021 o compromisso de neutralizar suas emissões até 2060 e, neste ano, pôs em prática regulamentações ESG e planos em favor da biodiversidade e da gestão de pegada de carbono. Especificamente com o Brasil, firmou no ano passado uma declaração conjunta, na qual ambos os países se comprometem a implementar leis de importação e exportação visando a eliminação do desmatamento ilegal.

 

Fatores como segurança alimentar e preço continuarão falando alto para o mercado chinês, mas a pecuária verde será demandada, cedo ou tarde. Não se descarta sequer a adoção de preços diferenciados para produtos comprovadamente livres de desmatamento. “O fato é que essa mudança virá e poderá representar uma grande oportunidade para o mercado brasileiro, se dispusermos de instrumentos de monitoramento robustos e já colocados à prova no mercado, como é o caso do Boi na Linha”, defende Guyot.

 

O Boi na Linha


O Boi na Linha surgiu em 2019, estabelecendo um protocolo MRV (monitoramento, relato e verificação) para frigoríficos da Amazônia que aderiram a um Termo de Ajustamento de Conduta firmado junto ao Ministério Público Federal. Ele descreve critérios e procedimentos para as auditorias que devem verificar e atestar a conformidade dos fornecedores diretos dos frigoríficos signatários. Coibição de desmatamento ilegal, de invasão de áreas públicas, de produção em áreas com embargo ambiental e de trabalho escravo forma a linha de base do protocolo. Ele também monitora produtividade e o trânsito entre fazendas, para evitar que gado ilegal seja transacionado juntamente com gado legal.

 

Hoje, 84% dos frigoríficos da Amazônia Legal autorizados a exportar para a China (23 plantas) já são comprometidos com o Boi na Linha. O protocolo é utilizado ainda por grandes redes varejistas, como Casino e Carrefour, e pela Febraban, como subsídio na gestão do risco de desmatamento ilegal.

 

0 visualização0 comentário

Comments


bottom of page