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PL do licenciamento 'inviabiliza desmatamento zero defendido por Lula', diz secretário do Meio Ambiente

  • Foto do escritor: Solano Ferreira
    Solano Ferreira
  • 31 de mai.
  • 5 min de leitura

Em entrevista à InfoAmazonia, André Lima, secretário de Controle do Desmatamento do governo, alerta que proposta do Congresso pode liberar obras sem estudos adequados e condenar parte significativa da Amazônia ao desmatamento. 

 

Por Fábio Bispo 

 

O projeto de lei que flexibiliza as regras do licenciamento ambiental no Brasil, aprovado na última semana pelo Senado (PL 2.159/2021), pode inviabilizar os compromissos climáticos e ambientais do país anfitrião da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30). O evento reúne políticos, organizações e diplomatas para definir metas para desacelerar o aquecimento global e ocorrerá em Belém, no Pará, em novembro deste ano.


"Os impactos diretos e indiretos dessa nova lei, se ela for aprovada da forma como está, podem inviabilizar as metas climáticas e a meta do desmatamento zero no Brasil, defendida pelo presidente Lula", afirmou André Lima, secretário extraordinário de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima (MMA), em entrevista à InfoAmazonia.

André Lima, secretário de Controle do Desmatamento. Foto: Rogério Cassimiro/MMA 
André Lima, secretário de Controle do Desmatamento. Foto: Rogério Cassimiro/MMA 

Os compromissos ambientais e climáticos do Brasil no Acordo de Paris (2015) para combater as mudanças climáticas preveem o desmatamento zero até 2030, a criação de mais áreas protegidas e a restauração florestal.


Com as mudanças propostas pelo Congresso, as terras indígenas, unidades de conservação e quilombos da Amazônia que já sofrem pressão crescente correm o risco de serem excluídos dos estudos de licenciamento ambiental. Se o texto atual for mantido, até 3 mil áreas protegidas podem simplesmente deixar de ser consideradas na análise de impactos de obras e empreendimentos.


Lima explica que o projeto em tramitação no Congresso fragiliza a proteção ambiental ao desconsiderar os impactos de grandes obras na Amazônia e ao criar mecanismos que encurtam prazos ou permitem autolicenciamento.


Em audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado, na manhã desta terça-feira (27), a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, alertou que a Amazônia "está entrando em ponto de não retorno, ", que pode ser provocado pelo avanço do desmatamento, levando o bioma perder sua capacidade de se recuperar e se regenerar.


"Existe um fenômeno avassalador que se chama mudança do clima. Se a gente não conseguir resolver esse problema, ele só vai piorar, e de forma assustadora em um país como o Brasil", disse a ministra aos senadores.


Marina Silva acabou abandonando a comissão após discutir com os senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Marcos Rogério (PL-RO). O debate começou após os senadores cobrarem o asfaltamento da BR-319. Aziz disse que os dados oficiais do governo brasileiro sobre desmatamento na área de influência da rodovia são "falsos".

Ministra do Meio Ambiente disse aos senadores que a Amazônia se aproxima do ponto de não retorno e que o desmatamento precisa ser freado. Foto: Rogério Cassimiro/MMA
Ministra do Meio Ambiente disse aos senadores que a Amazônia se aproxima do ponto de não retorno e que o desmatamento precisa ser freado. Foto: Rogério Cassimiro/MMA

Mudanças ameaçam 17 milhões de hectares  

 

O PL do Licenciamento foi aprovado pela Câmara em 2021, mas, após as modificações aprovadas pelo Senado na última semana, o texto precisará retornar à análise dos deputados antes de seguir para sanção presidencial.


A tramitação é acompanhada por diversas articulações para viabilizar obras e empreendimentos na Amazônia. Entre elas, estão a tentativa de exploração de petróleo na Foz do Amazonas; novas concessões de rios para o escoamento da produção do agronegócio; a construção das hidrovias do Madeira e do Araguaia; a exploração de minérios, como no projeto de potássio no Amazonas; e a construção de rodovias e ferrovias, a exemplo da BR-319 e da Ferrogrão.


Um estudo realizado pelo Instituto Socioambiental (ISA) aponta que ao menos 75 obras previstas no Programa de Aceleração do Crescimento Mudanças ameaçam 17 milhões de hectares de floresta da necessidade de estudos ambientais e medidas de mitigação — que servem para reduzir os impactos dos empreendimentos.


Segundo a análise, considerando os critérios atuais, 277 áreas protegidas seriam abrangidas por exigências de licenciamento. No entanto, com o texto atual do PL, esse número cairia para 102 áreas, afetadas por 42 obras (4 ferrovias, 1 hidrelétrica, 2 hidrovias, 7 portos e 28 rodovias).


BR-319 e Ferrogrão podem impulsionar desmatamento 

Indígenas Kayapó fecham a BR-163 durante protesto contra Ferrogrão. Foto: Lucas Landau/Instituto Kabu Crédito: LUCAS LANDAU
Indígenas Kayapó fecham a BR-163 durante protesto contra Ferrogrão. Foto: Lucas Landau/Instituto Kabu Crédito: LUCAS LANDAU

À InfoAmazonia, Lima destacou dois projetos como os mais críticos para o avanço do desmatamento na Amazônia: as obras da rodovia BR-319 e da ferrovia Ferrogrão, cujos impactos ambientais indiretos deixariam de ser considerados pelo texto proposto pelos parlamentares.


"A obra da BR-319 tem um potencial de emissões de 8 gigatoneladas de carbono. São quatro anos de emissões globais do Brasil numa única obra na Amazônia, dependendo de como ela for executada", observa Lima.

 

A rodovia que liga Porto Velho (RO) a Manaus (RO), construída pelo governo militar em 1976, foi desativada em 1988. O trajeto a ser reconstruído cortaria uma grande região preservada da Amazônia, onde estão ao menos 69 terras indígenas e 41 unidades de conservação. No entanto, só com as promessas da obra, o desmatamento na área de influência da rodovia chegou a ser duas vezes e meia maior do que a média para toda a Amazônia.


Estudos publicados por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) indicam que a rodovia poderia impulsionar o desmatamento da Amazônia em 1.200%. A obra para reconstrução da rodovia já foi proposta nos governos de Fernando Henrique (1994-2001), Lula (2003-2010), Dilma (2011-2016) e Bolsonaro (2019-2022), o que mais avançou com o projeto. No entanto, nenhum deles conseguiu obter o licenciamento ambiental.


No caso da Ferrogrão, o empreendimento terá impacto em pelo menos seis terras indígenas — incluindo territórios de três povos isolados — e 17 unidades de conservação, segundo levantamento exclusivo da InfoAmazonia e do Joio e o Trigo. O projeto é planejado para ligar o norte de Mato Grosso ao porto de Miritituba, no Pará, e tem potencial de agravar o desmatamento que já se tornou um problema ao longo da BR-163, paralelo ao trecho da ferrovia.


"Se não forem adotados, previamente, os cuidados de governança ambiental, a gente pode estar condenando uma parte expressiva da Amazônia a desmatamento, grilagem, garimpo ilegal, ocupação de territórios de populações tradicionais, exploração madeireira clandestina e incêndios florestais", alerta Lima.

Avanço do desmatamento no interior de Porto Velho, Rondônia. Foto: Fábio Bispo/InfoAmazonia Crédito: Washington Fidelis 
Avanço do desmatamento no interior de Porto Velho, Rondônia. Foto: Fábio Bispo/InfoAmazonia Crédito: Washington Fidelis 

MMA articula vetos do presidente Lula 

 

Lima destaca que a desobrigação dos estudos ambientais pode ser ainda mais grave com a criação da chamada Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC), que é emitida de forma autodeclaratória. "Praticamente aperta um botão e sai a licença", explica o secretário.


Como exemplo, ele cita obras de médio impacto que podem ser aprovadas pela LAC, como pequenas hidrelétricas. "Poderá haver dezenas dessas pequenas hidrelétricas em um mesmo trecho de um rio. Cada uma licenciada por adesão e compromisso".


Outros trechos da lei, como a Licença Ambiental Especial (LAE), incluída no Senado; e o enfraquecimento do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), também são consideradas mudanças graves, segundo Lima.


No caso da LAE, o dispositivo prevê tramitação diferenciada para projetos considerados como "estratégicos" por um conselho do governo. A medida poderia ser aplicada, por exemplo, para os futuros projetos de petróleo na Foz do Amazonas, que tem leilão para 47 blocos previsto para junho. Nesse caso, o licenciamento deveria ser concluído no prazo de até um ano. A proposta é uma das que precisa de análise dos deputados.


A expectativa dentro do governo, segundo Lima, é da derrubada das alterações promovidas no Senado, como é o caso da LAE, e posteriormente o veto do presidente Lula. "Dependendo de como o projeto for aprovado na Câmara, vamos trabalhar internamente para que haja vetos, porque realmente ele [projeto de lei] tem problemas graves, inclusive de inconstitucionalidade".


Outro desdobramento possível, segundo Lima, seria "uma enxurrada de judicialização" diante dos pontos considerados inconstitucionais pelos técnicos do MMA. O que novamente poderia deslocar as pressões políticas para o Supremo Tribunal Federal (STF).

 

Crédito: Fábio Bispo*  

*a autorização para republicação do conteúdo se dá mediante publicação na íntegra, com crédito e redirecionamento (link) para a publicação original. O InfoAmazonia não se responsabiliza por alterações no conteúdo feitas por terceiros. 


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