Radar meteorológico flagra espiral de 422 mil andorinhas sobre a Amazônia
- Solano Ferreira
- 19 de ago.
- 2 min de leitura
Milhares de andorinhas se reúnem em grandes dormitórios durante a noite. Logo pela manhã, elas levantam vôo em sincronia, e são observadas pelos radares meteorológicos locais

Foto: Kyle G. Horton
Pesquisadores da USP e da Universidade Estadual do Colorado desvendaram, pela primeira vez, o paradeiro e a escala de grandes dormitórios de andorinhas na Amazônia ao analisar dois anos de dados do radar meteorológico do Sipam (Serviço de Proteção da Amazônia), em Manaus. O estudo, que acaba de ser publicado na revista Ecology and Evolution, mostra que os radares — tradicionalmente usados para prever o tempo — também podem monitorar movimentos impressionantes de aves migratórias em tempo real.
O levantamento identificou três dormitórios permanentes e cinco transitórios situados principalmente em áreas protegidas próximas aos rios Negro e Amazonas, a menos de 50 km de Manaus. Os dados de radar revelaram que, em determinadas manhãs, até 422 mil andorinhas saem em espiral desses dormitórios ao amanhecer. O padrão registrado, chamado de “donut” (como se fosse um pneu), corresponde à dispersão simultânea de milhares de aves.
No estudo, os pesquisadores utilizaram o radar meteorológicodo SIPAM, instalado em Manaus, originalmente projetado para acompanhar chuvas e tempestades na região amazônica. Esse equipamento emite ondas eletromagnéticas e detecta o eco refletido por objetos em movimento no ar, como gotas de chuva ou, neste caso, milhares de andorinhas voando na alvorada.
Para identificar quais espécies formavam esses grandes bandos, os pesquisadores cruzaram os dados de radar com registros de observadores em plataformas como WikiAves e eBird, o que permitiu detalhar a composição dos dormitórios
Comparando os resultados amazônicos com dados de 12 radares que cobrem os Grandes Lagos, nos Estados Unidos, os autores constataram que os rios ao redor de Manaus acolhem de quatro a sete vezes mais andorinhas por dia, apesar de a área norte-americana monitorada ser quase nove vezes maior. Entre as espécies prováveis estão a andorinha-azul (Progne subis), que se reproduz na América do Norte, e a pouco conhecida andorinha-do-sul (Progne elegans), migrante da Argentina e do Sul do Brasil.
“É fascinante pensar que estas aves migratórias, usadas por muitas culturas para medir a passagem do tempo, conectam os Cree do Canadá ao povo Tehuelche do Sul da Argentina, e que o elo desta corrente está na Amazônia”, diz a bióloga Maria Belotti, autora principal do estudo.
Segundo ela, essa dinâmica reforça o papel essencial das unidades de conservação ao redor de Manaus, que ajudam a conter o avanço do desenvolvimento urbano na região. “Os impactos de ameaças a essas andorinhas na Amazônia serão sentidos nos dois extremos das Américas e podem provocar alterações significativas em cadeias alimentares e ecossistemas separados por mais de 10.000 km”, afirma.
A equipe vê na metodologia uma ferramenta promissora para prever “tempestades” de aves e orientar políticas de conservação, além de reduzir colisões em aeroportos e ajustar a operação de parques eólicos. O próximo passo é integrar dados de mais radares brasileiros a observações de campo para estudar não apenas a dispersão de andorinhas, como também os movimentos de outras aves migratórias em escala continental.
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Fonte: Agência Bori










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