top of page

Cerrado perde uma Espanha de vegetação nativa em 40 anos

  • Foto do escritor: Solano Ferreira
    Solano Ferreira
  • 18 de ago.
  • 4 min de leitura

 

Entre 1985 e 2024, 28% da área de vegetação foi derrubada; a agricultura, com aumento de 544%, foi o uso da terra que mais cresceu proporcionalmente.


Karina Custódio*


O Cerrado perdeu 40,5 milhões de hectares de vegetação nativa entre 1985 e 2024, uma área maior que o território da Espanha, ou duas vezes a área do Estado do Paraná. A perda corresponde a 28% da cobertura nativa do bioma em 1985 e coloca o Cerrado como o segundo mais impactado entre os biomas brasileiros, atrás apenas do Pampa. É o que mostra levantamento, feito pela Coleção 10 do MapBiomas, rede de organizações da qual o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) faz parte.

 

Com uma expansão de 22,1 milhões de hectares, a agricultura foi o tipo de uso da terra que mais cresceu no bioma, um incremento de 533% em relação à sua área em 1985. A pastagem aumentou 14,7 milhões de hectares (44% de aumento), seguida por 2,7 milhões de hectares de aumento na silvicultura (446% de aumento). Todos os tipos de vegetação nativa tiveram queda no período, sendo a formação savânica a mais afetada pelo desmatamento, totalizando uma perda de 26,1 milhões de hectares (uma redução de 32% em relação a 1985).

 

“A perda de vegetação nativa compromete diretamente a resiliência do Cerrado e suas populações frente às mudanças climáticas, agravando cenários de seca e intensificando a pressão por recursos hídricos, comprometendo a própria produção agrícola do bioma e do país no longo prazo”, avalia Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM.

 

Quatro décadas de mudanças no uso e cobertura da terra

 

O levantamento traça o perfil de uso e cobertura do bioma em cada uma das quatro décadas. Na primeira, o principal vetor de mudança foi a retirada de vegetação nativa para expansão de pastagem. A partir da segunda década, a agricultura foi o uso da terra que mais avançou sobre o bioma, enquanto a intensificação agrícola (transição de pastagem para agricultura) também ganhou força no sul do Cerrado. Além disso, a superfície da água enfrentou queda entre 2012 e 2019, voltando a crescer em 2021, graças ao aumento de área de água em reservatórios e hidrelétricas.

 

“Ao longo de quatro décadas, o Cerrado passou por significativas transformações no uso da terra. Até 1995, a expansão da pecuária foi a principal força de conversão, enquanto a partir dos anos 2000 a agricultura ganhou protagonismo. Essas mudanças alteraram a configuração do bioma, redefinindo a ocupação do território, com cada década apresentando ritmos e padrões distintos de transformação”, comenta Bárbara Costa, analista de pesquisa do IPAM.

 

O período foi marcado por transformações em políticas públicas como a criação do Código Florestal, a instituição do Dia do Cerrado e o fortalecimento da política nacional de conservação, com o aumento de unidades de conservação provocado pela constituição do SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação).

 

1985–1994: a década da conversão acelerada

 

No período, foram perdidos 15,3 milhões de hectares de vegetação nativa, o maior desmatamento entre as quatro décadas.

 

A conversão foi liderada pela expansão da pastagem (13,2 milhões de hectares), concentrada principalmente no centro-sul do bioma, (onde estão DF, GO, MG, MS, MT, PR e SP). A agricultura ainda avançava de forma mais localizada, com 2,2 milhões de hectares convertidos diretamente da vegetação nativa, e a intensificação do uso (conversão de pastagem para agricultura) ainda era incipiente.

 

Foi também nessa década que o Matopiba (região que compreende os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) começou a despontar como nova fronteira agrícola.

 

1995–2004: avanço no Matopiba e queda na superfície de água

 

A perda de vegetação nativa desacelerou em relação à década anterior, somando 10 milhões de hectares. A conversão de vegetação para pastagens caiu para 9,3 milhões de hectares, ainda concentrada no centro-sul. De toda a área desmatada para agricultura no bioma, 45% concentrou-se no Matopiba.

 

Foi também neste período que, em 2001, o Cerrado registrou a menor superfície de água em 40 anos, 8% abaixo da média histórica.

 

2005–2014: desaceleração do desmatamento e pico da intensificação

 

Apesar da menor perda de vegetação nativa entre as quatro décadas (5,9 milhões de hectares a menos), o bioma viveu sua maior transformação no uso da terra. Houve pico da intensificação agrícola, principalmente no centro-sul do bioma, onde 3,9 milhões de hectares de pastagem foram convertidos em agricultura, 81% fora do Matopiba.

 

Enquanto isso, o Matopiba registrou o maior salto de substituição de vegetação nativa por agricultura em quatro décadas, totalizando 1,8 milhões de hectares, 8 de cada 10 hectares desmatados para agricultura no bioma ocorreram na região. Silvicultura também teve crescimento recorde, com 437 mil hectares de vegetação nativa convertidos.

 

“Esse período marca a consolidação do Matopiba como uma das maiores e mais velozes frentes de desmatamento e expansão agrícola do planeta. É uma região altamente sensível, por carecer de áreas protegidas e abrigar os maiores remanescentes contínuos de vegetação nativa do bioma, que são altamente ameaçados por essa nova fronteira”, afirma Dhemerson Conciani, pesquisador do IPAM.

 

Em 2012, o Código Florestal foi aprovado, determinando a conservação de até 35% das áreas de vegetação nativa em imóveis rurais no Cerrado.

 

2015–2024: retomada do desmatamento

 

Já na última década do levantamento, o desmatamento voltou a subir, foram 6,4 milhões de hectares suprimidos, um aumento de 8% em relação à década anterior. A conversão para pastagens seguiu predominante (4,9 milhões de hectares), mas em menor ritmo que as décadas anteriores. A agricultura ocupou 598 mil hectares convertidos diretamente da vegetação nativa, sendo 441 mil hectares no Matopiba.

 

O padrão observado no sul do Cerrado foi de intensificação persistente, totalizando 1,7 milhões de hectares de pastagem transformados em agricultura. Após 40 anos, o Cerrado ainda tem 51% de seu território coberto por vegetação nativa.


________________________

*Karina Custódio, analista de comunicação.


ree

Comentários


Quem somos

O Blog MUNDO E MEIO é um canal de comunicação segmentado para o jornalismo ambiental, sustentabilidade, economia responsável, pesquisas que apresentam resultados transformadores, tecnologias e inovações que ajudam na vida sustentável.

Enfim, somos guiados pelo interesse coletivo visando a vida equilibrada neste planeta, de forma que as futuras gerações encontrem condições naturais e humanas que garantam a continuidade dos ciclos vitais.

Presamos pela verdade, pelo jornalismo ético e acreditamos que é possível melhorar a vida no meio em que vivemos com práticas responsáveis que levam para o equilíbrio e promovam o desenvolvimento sustentável. Por isso, tudo o que publicamos, buscamos evidências que comprovem e afirmam o que está destacado no conteúdo.

TIPOS DE CONTEÚDOS:

Notícias: publicações de fatos e acontecimentos do cotidiano que sirvam para a reflexão e para a criação de múltiplos pontos de vista soabre o tema.

Análises: Textos produzidos por especialistas e conhecedores de temas que possam contribuir com a formação da opinião e do discernimento sobre o assunto abordado.

Opinião: Textos produzidos por pessoas com amplo domínio quanto ao assunto tratado.

Pesquisas: Conteúdos de divulgação de resultados de pesquisas que favoreçam para a sustentabilidade tendo como autores profissionais e instituições renomadas que possam certificar originalidade e segurança de resultados.

Conteúdo patrocinado: Informações de interesse público produzidos e distribuídos por empresas ou instituições tendo como finalidade mostrar suas mensagens e ideias dentro do contexto editorial deste periódico.

Fale conosco

SF Comunicação e Marketing

Rua Patápio Silva, 5412 bairro Flodoaldo Pontes Pinto

CEP 76820-618 Porto Velho - RO

WhatsApp: 69 99214-8935

Editor Responsável: Solano de S. Ferreira DRT/RO 1081

E-mail: redacao.mundoemeio@gmail.com

  • Black Facebook Icon
  • Black Twitter Icon
  • Black Instagram Icon

Gratos pelo contato

bottom of page