Embalagem inteligente muda de cor para avisar que o peixe estragou
- Solano Ferreira
- há 5 dias
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Foto: Matheus Falanga

Uma nova tecnologia desenvolvida por cientistas brasileiros promete revolucionar a forma como identificamos alimentos impróprios para consumo: uma embalagem que muda de cor conforme o alimento se deteriora. O sistema, que utiliza pigmentos naturais extraídos do roxo roxo, foi criado por pesquisadores da Embrapa Instrumentação (SP), em parceria com a Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) e a Universidade de Illinois, em Chicago, nos Estados Unidos ( UIC ).

A inovação da ciência brasileira foi empregar atécnica de concentração por sopro em solução para produzir mantas de nanofibras inteligentes usando pigmentos vegetais naturais. As mantas, utilizadas como embalagens, são capazes de monitorar a qualidade dos alimentos em tempo real pela alteração da cor. A alteração da embalagem édesencadeada pela interação química entre os compostos liberados durante a flexibilidade e o material da embalagem. Em testes em laboratórios, a mantaapresentou ótimos resultados, mudou de roxo para azuldurante monitoramento do frescor do filé de merluza.
A cor roxa indicava que o alimento estava protegido ao consumo ( foto abaixo ). Mas, depois de 24 horas, o cor tornou-se menos intenso e, após 48 horas, surgiram tons azuis-acinzentados. Passadas 72 horas, a cor azul sinalizou a restrição do filé de peixe armazenado, sem a necessidade de abrir a embalagem.

Para os pesquisadores da Embrapa, os resultados mostram que mantas compostas de nanofibras se comportam como materiais inteligentes, exibindo mudanças visíveis na cor durante o processo de limitação de filés de peixe. Porém, embora essa característica aponte o uso potencial das mantas no monitoramento do frescor de peixes e frutos do mar, os cientistas dizem que há necessidade de ampliar os estudos para validar sua aplicação em diferentes espécies.
SBS é uma alternativa à técnica convencional
A técnica de discussões por sopro em solução (SBS, do inglês Solution Blow Spinning), desenvolvida em 2009 por pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba ( UFPB ), da Embrapa Instrumentação, em parceria com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos ( USDA ), é capaz de produzir micro e nanoestruturas poliméricas, e apresenta diversas vantagens. Entre elas, a rapidez no desenvolvimento das nanofibras, que leva apenas duas horas.

A técnica ainda apresenta escalabilidade, elegância, fácil manejo, além de ser de baixo custo e utilizar forças aerodinâmicas para a produção das nanofibras, o que reduz muito o consumo de energia. A técnica foi descrita pelos autores em artigo no Journal of Applied Polymer Science .
As nanofibrasões são estruturas em escala nanométrica que podem formar tecidos. Um nanômetro é equivalente a um bilionésimo de um metrô. “Os estudos anteriores sobre nanofibras inteligentes contêm antocianinas extraídas de alimentos usados condicionalmente usando a técnica de eletrofiação”, conta Josemar Gonçalves de Oliveira Filho, que desenvolveu o processo em seu pós-doutorado.

Manta é reforçada com pigmentos naturais
O estudo de Oliveira Filho foi supervisionado pelo pesquisador da Embrapa Luiz Henrique Capparelli Mattoso , no Laboratório Nacional de Nanotecnologia para o Agronegócio ( LNNA ). Parte da pesquisa foi realizada no Departamento de Engenharia Mecânica e Industrial da Universidade de Illinois, em Chicago (EUA).
No estudo, os pesquisadores utilizaram antocianinas e o polímero biocompatível e biodegradável, conhecido como policaprolactona. As antocianinas são pigmentos naturais encontrados em algumas plantas, frutas, flores e vegetais, que apresentam uma ampla gama de cores como vermelho, rosa, azul, roxo, cinza, verde e amarelo.
Elas mudam de cor conforme o pH (grau de acidez ou alcalinidade) do meio em que se encontram. Na pesquisa, as antocianinas foram extraídas de resíduos de repolho roxo. Como o rolo roxo é rico em antocianinas, pode ser utilizado como indicador de pH. O estudo testou mais de dez pigmentos, a maioria dos vegetais. “As nanofibras demonstraram capacidade de monitorar a restrição de filés de peixe em tempo real, revelando potencial como materiais de embalagem inteligentes para alimentos”, avalia Oliveira Filho.
O pós-doutorando ( foto abaixo ) deixa claro que, embora, as pesquisas sobre o uso de antocianinas de resíduos alimentares na produção de outros materiais inteligentes estejam documentadas na literatura, as informações são escassas sobre a aplicação desses extratos na produção de nanofibras inteligentes.

Já Mattoso explica que a policaprolactona, polímero biodegradável usado na embalagem, possui boa flexibilidade e resistência mecânica, o que é vantajoso para a proteção de alimentos. Além disso, tem potencial para uso em uma ampla gama de solventes e baixa temperatura de fusão, o que facilita o processamento com menor consumo de energia.
"Por isso, é considerada uma alternativa para o desenvolvimento de nanofibras para diversas aplicações. Quando combinadas com antocianinas, as nanofibras apresentam uma capacidade notável de monitorar mudanças de pH, detectar a produção de amônia e aminas voláteis, além de identificar o crescimento de bactérias. Esses indicadores são essenciais para sinalizar a sinalização em produtos como peixes e frutos do mar", detalha o especialista em nanotecnologia.
Uso de resíduos ajuda a reduzir perdas de alimentos

Oliveira Filho diz que a produção da manta de nanofibras e inicia com uma solução polimérica, obtida pela mistura e melhoria da policaprolactona, extrato de repolho e do ácido acético. Em seguida, essa solução é introduzida no equipamento de SBS, que é composto por uma fonte de gás comprimido, um regulador de pressão para controlar o fluxo de gás, uma bomba de injeção que direciona a solução para a matriz de tensões com bico, e um coletor com velocidade de rotação ajustável, onde as nanofibras são depositadas para formar a manta. O processo final resultante em fibras em escala nanométrica, similares às fibras de algodão.
Mattoso lembra que usar resíduos do setor varejista para extrair antocianinas e aplicar os indicadores colorimétricos pode agregar valor a esses alimentos descartados, ao mesmo tempo em que reduz o impacto ambiental negativo do descarte.
Os dados da pesquisa foram publicados no artigo “ Produção rápida e sustentável de esteiras de nanofibras inteligentes por fiação por sopro de solução para monitoramento da qualidade de alimentos: Potencial de policaprolactona e antocianinas derivadas de resíduos agroalimentares ” na Food Chemistry.

A pesquisa foi apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo ( Fapesp ), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ( Capes ) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ( CNPq ) por meio do INCT Circularidade em Materiais Poliméricos, liderada pela Embrapa Instrumentação.
Fotos da matéria: Matheus Falanga
Joana Silva (MTb 19.554/SP)Embrapa Instrumentação
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